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Ministério Público Estadual e Federal pedem destituição da direção do Hospital Laureano por suspeita de fraude

Antônio Carneiro Arnaud, presidente da Fundação do Hospital Napoleão Laureano

O Ministério Público da Paraíba (MPPB) e o Ministério Público Federal (MPF) ajuizaram uma ação civil pública com pedido de tutela de urgência contra a Fundação Napoleão Laureano – mantenedora do Hospital Napoleão Laureano, referência no tratamento do câncer na Paraíba – e mais 14 pessoas para destituí-las da diretoria da entidade de direito privado e sem fins lucrativos, em razão de fraudes contábeis e outras irregularidades.

A ação (número 0810457-22.2020.4.05.8200) tramita na 2ª Vara Federal da Paraíba e é assinada pelo 40º promotor de Justiça do MPPB, Alexandre Jorge do Amaral Nóbrega (que atua na defesa das fundações e terceiro setor em João Pessoa), e pelo procurador da República, José Guilherme Ferraz. Nela, os Ministérios Públicos requerem o afastamento permanente dos membros do Conselho Deliberativo, da Diretoria Executiva e do Conselho Fiscal da Fundação Napoleão Laureano, transformando-se em definitivo o deferimento do pedido de tutela de urgência; a incidência de multa diária no valor de R$ 10 mil, em caso de descumprimento da sentença e a condenação dos promovidos ao pagamento das despesas e custas processuais relativas a emolumentos e outros encargos.

A ação civil pública é um desdobramento de procedimentos instaurados no MPF e também no MPPB para apurar denúncia envolvendo a Fundação e o Hospital Napoleão Laureano. No âmbito do MPF, foi instaurado inquérito civil em razão de reclamações sobre o atraso no início dos tratamentos de quimioterapia, radioterapia e cirurgias eletivas, em decorrência de um evidente desequilíbrio econômico-financeiro por parte do hospital, que posteriormente foi agravado pelo desabastecimento de medicamentos e/ou insumos, provocando a interrupção dos serviços de saúde a pacientes em situação de urgência. Em razão disso, foi formulado pedido de tutela de urgência em caráter antecedente perante o Juízo da 3ª Vara Federal de João Pessoa, contra a União, o Estado da Paraíba e o Município de João Pessoa, visando obter diversas providências para a regularização dos atendimentos oncológicos na unidade hospitalar, inclusive a determinação de auditoria a ser realizada pelo Ministério da Saúde para averiguação das causas da falha de serviços detectada naquela entidade privada.

Paralelamente às investigações conduzidas pelo MPF, tramitava na Promotoria de Fundações e Patrimônio Público da Capital, dois procedimentos administrativos embasados em informações oriundas da Controladoria-Geral da União (CGU) e em denúncias anônimas que apontavam uma série de irregularidades na gestão do Hospital Napoleão Laureano e uma notícia de fato respaldada em um relatório de vistoria encaminhado, em 2019, pelo Conselho Regional de Medicina do Estado Paraíba (CRM-PB), cujo teor era exatamente o foco do conteúdo analisado pelo inquérito civil instaurado pelo MPF: a insuficiência na prestação de serviços de saúde em oncologia por falta de insumos, quimioterápicos, medicamentos em geral, equipamentos danificados, bem como pela elevada demanda de pacientes que buscavam tratamento naquele hospital.

Diante disso, foi celebrado um Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (TAC) entre o MPPB, MPF e a Fundação Napoleão Laureano com o objetivo de desvelar as causas da grave situação financeira deficitária, ostentada pelo hospital, e apontar as medidas necessárias para a correção das falhas existentes, mediante o emprego da expertise técnica oriunda dos Conselhos Regionais de Contabilidade (CRC), de Administração (CRA) e Medicina.

O TAC previa além de medidas para regularização do atendimento dos pacientes oncológicos do Sistema Único de Saúde (SUS), a criação de uma comissão auxiliar de avaliação, a ser formada por integrantes designados pelos três conselhos de classe, com o status de auditoria independente na identificação dos problemas administrativos e contábeis no hospital e na Fundação. Essa comissão passou a elaborar as informações administrativas e contábeis constantes dos autos, além de empreender outras diligências, como a participação nas audiências realizadas pelo Ministério Público com médicos e prestadores de serviços; acesso ao sistema de informações gerenciais do hospital; reuniões com integrantes da direção da Fundação com vistas aos esclarecimentos dos fatos; dentre outras medidas.

Em 14 de outubro de 2019 foi decretado o sigilo das investigações em curso nos autos do procedimento administrativo nº 001.2019.004700, com o objetivo de evitar a divulgação de informações ainda não consolidas, especialmente para não trazer prejuízos desnecessários à imagem da fundação investigada. Uma decisão proferida em dezembro de 2020, pela Justiça Federal retirou o segredo.

Irregularidades

Segundo a ação civil pública, a comissão especial de auditoria designada pelo CRC realizou, durante o período de 30 de janeiro a 16 de março de 2020, uma investigação contábil na gestão do Hospital Napoleão Laureano dos últimos cinco anos, e detectou várias anomalias contábeis e financeiras.

Foi constatado que, entre os exercícios financeiros de 2015 a 2019, o hospital, a mercê da implementação de uma precária e irresponsável gestão financeira, adentrou em processo de endividamento crescente ao longo do quinquênio analisado, registrando um aumento de 510% de sua dívida o que, por sua vez, repercutiu diretamente na redução drástica do cumprimento de sua atividade finalística.

O relatório do CRC também apontou que, enquanto os atendimentos aos pacientes com câncer sofria uma drástica redução – principalmente no ano de 2019 pela redução expressiva nos gastos com a compra de medicamentos e material cirúrgico e médico-hospitalar – os salários dos dirigentes do hospital cresceram exorbitantemente, em índices que superaram a inflação do período em 11,08%. “Nota-se, às claras, o desvio de finalidade da diretoria da Fundação na adoção de um modelo deplorável de gestão, em que mesmo diante de um caos financeiro, a mesa diretora não media esforços para assegurar os altos salários dos seus dirigentes, em percentuais sempre acima da média do mercado, em prejuízo do cumprimento do objetivo estatutário da entidade que era o de fornecer tratamento contra o câncer à população carente”, diz a ação.

O CRC também apontou a existência de fraude contábil nos balanços, balancetes e contratos examinados e a omissão intencional de dívidas significativas por parte da Fundação no encaminhamento feito ao Ministério Público. Já o CRA registrou que a fundação não possui planejamento estratégico e orçamentário, vivendo em um total desarranjo organizacional, não dispondo sequer de politica de recursos humanos nas suas contratações pelo critério da meritocracia. O CRM, por sua vez, informou que, nas visitas realizadas, foi possível verificar que a situação no hospital era muito ruim em todas as áreas, que pacientes compravam medicamentos dentro do hospital, além da existência de denúncias de corporativismo, nepotismo, dentre outros.

Os fatos registrados pela auditoria contábil do CRC foram considerados gravíssimos e, por demandarem o necessário exame igualmente na seara criminal, serão encaminhados aos Grupos de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado dos Ministérios Públicos Federal e Estadual, para a adoção de providências.

Para o promotor de Justiça e o procurador da República, a remoção dos integrantes que compõem os órgãos estruturais da Fundação Napoleão Laureano é uma medida necessária para imprimir “um choque de gestão no caótico modelo de governança entabulado pela diretoria da entidade nos últimos anos”. “Os conselhos integrantes da comissão auxiliar apontaram falhas gravíssimas na gestão da Fundação e na condução do Hospital Napoleão Laureano, pela inobservância de princípios básicos de administração e de contabilidade, a ponto de ser rotulada como uma gestão temerária. A pretensão palmilhada na presente demanda interventiva, diante de tantos desvios apurados, é medida imperiosa e urgente”, argumentam.

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