Na sessão desta quarta-feira (29), o Pleno do Tribunal de Justiça da Paraíba recebeu denúncia oferecida pelo Ministério Público contra o deputado estadual Manoel Ludgério Pereira Neto, sua esposa Ivonete Almeida de Andrade Ludgério e o assessor parlamentar Carlos Alberto André Nunes. Os três teriam incorrido no desvio de verbas públicas em proveito próprio, mediante a nomeação da empregada doméstica Elizete de Moura para exercer função de confiança na Assembleia Legislativa, sem o conhecimento desta e sem a devida prestação de serviço, beneficiando-se das verbas remuneratórias percebidas por ela.
Conforme os fatos narrados na peça acusatória, Elizete de Moura trabalhou como empregada doméstica na residência do casal Manoel Ludgério e Ivonete Ludgério nos períodos de 01/11/1999 a 30/03/2014. Ela foi nomeada para exercer a função de confiança na Assembleia Legislativa, com lotação no gabinete do deputado Manoel Ludgério, nos períodos de 01/02/2003 a 31/05/2004, de 01/01/2007 a 30/06/2007, e, ainda, para compor o Grupo de Apoio ao Mandato Parlamentar, de 01/07/2007 a 28/02/2009.
Em 2007, a Assembleia Legislativa do Estado, que antes pagava os salários através de cheque nominal, passou a depositar o salário em conta-corrente. Em abril de 2007, Elizete de Moura comentou com a sua patroa a intenção de adquirir uma motocicleta. Assim, a denunciada Ivonete designou o assessor parlamentar Carlos Alberto André Nunes para auxiliar Elizete.
Em 14/04/2007, Carlos Alberto conduziu Elizete a uma agência do Banco do Brasil e viabilizou a abertura de uma conta-corrente em nome desta. Em maio de 2007, Elizete foi auxiliada por Carlos Alberto a adquirir, junto à empresa Gran-Moto Campina Grande Motores Ltda. uma motocicleta BIS 125 ES, mediante o financiamento no valor de R$ 6.427,23, utilizando como endereço o da residência de seus patrões.
A denunciada Ivonete Ludgério combinou com Elizete de Moura que pagaria o financiamento da motocicleta e que descontaria do salário como empregada doméstica o valor de R$ 250,00, de modo que ficou na posse do cartão e da senha da conta bancária da empregada e dos boletos do financiamento.
Os vencimentos percebidos por Elizete pela função de confiança exercida na Assembleia Legislativa eram depositados na conta-corrente, cujo cartão e senha bancária ficaram na posse de Ivonete. Foi constatada que houve transferências bancárias realizadas da conta-corrente de Elizete de Moura em favor de Antônio Almeida de Andrade, de Carlos Alberto e de Mônica de França Leite.
Em 30/03/2014, Elizete foi despedida sem justa causa, da residência dos denunciados Manoel Ludgério e Ivonete Ludgério. Após o fim da relação trabalhista, ela foi tentar receber o valor do PIS na Caixa Econômica Federal, sendo, na oportunidade, informada acerca da existência de cadastro em seu nome no PASEP, referente a um vínculo com a Assembleia Legislativa do Estado.
Elizete de Moura relatou o desconhecimento da existência de vínculo laboral com a Casa Legislativa ao Ministério Público Federal, através de representação criminal, à Polícia Federal e, ainda, nos próprios autos da Reclamação Trabalhista nº 0130354-71.2014.5.13.0023.
Alegações das defesas Em resposta escrita, Manoel Ludgério sustentou que Elizete de Moura desempenhou concomitantemente, duas atividades profissionais, sendo um turno na residência deste e, no outro, como assessora especial no gabinete político na cidade de Campina Grande ou em algum órgão público. Sustentou, ainda, a impossibilidade de Elizete afirmar o desconhecimento do contrato de prestação de serviços firmado com a Assembleia Legislativa, posto que foi por ela assinado.
A defesa de Carlos Alberto André Nunes sustentou ser inverídica a afirmação de ter acompanhado Elizete à agência do Banco do Brasil para abertura de uma conta-corrente, pois, segundo informes do próprio estabelecimento financeiro, a conta foi aberta diretamente pela titular, não tendo cedido poderes a terceiros para movimentar a referida conta.
Por sua vez, Ivonete Ludgério apresentou resposta escrita, aduzindo existir contradição nas declarações prestadas por Elizete de Moura, posto existir prova de que ela desempenhou concomitantemente duas atividades profissionais, uma no âmbito familiar e outra em órgão público a que estava vinculado.
Desembargador Ricardo Vital de Almeida
Voto- No exame do caso, o relator do processo (Procedimento Investigatório Criminal nº 0000668-50.2018.815.00000), desembargador Ricardo Vital de Almeida, destacou que a denúncia se encontra lastreada em prova da materialidade do crime. “Há, nos autos, fortíssimos indícios da nomeação de Elizete de Moura como “servidora fantasma” da Casa Legislativa estadual, não tendo os noticiados logrado elidir de plano a acusação, nem afastado, de imediato, a existência de fato típico e antijurídico”, ressaltou.
De acordo com o relator, nesta fase de recebimento da denúncia, a dúvida é em favor da sociedade, prevalecendo o princípio in dubio pro societate. “Evidentemente, os fatos narrados na denúncia somente poderão ser comprovados ou refutados após a dilação probatória, devendo ser assegurado ao Parqueta oportunidade processual de complementar os elementos que embasam a acusação”, observou.
Em seu voto, Ricardo Vital deixou de decretar a prisão preventiva dos denunciados por entender não estarem presentes os requisitos autorizadores da medida. Também não determinou o afastamento dos denunciados dos cargos ou funções públicas, tendo em vista que os fatos foram teoricamente cometidos de 2003 a 2009 e ante a primariedade dos denunciados, bem como diante da inexistência de notícias da prática de atos obstaculatórios ao andamento do feito.
Da decisão cabe recurso.
Por Gabriella Guedes e Lenilson Guedes/Gecom-TJPB